Category Archives: prisões

Vá para a cadeia

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Subornos para fechar cadeias estatais que concorrem com privadas já não é novidade nos Estados Unidos. Inventar presos para receber mais algum do Estado também não. O negócio agora é prender o mais possível para aumentar a população prisional e assim aumentar também as receitas. Com a vantagem de não indignar os contribuintes por estarem a pagar pela estadia de presos que não existem.

Dois juízes da Pensilvânia foram condenados a semana passada por receberem subornos para prender indevidamente cerca de 2000 adolescentes. Uma por ridicularizar o director da escola numa página de Internet, outra por invadir um edifício desocupado, outra por esbofetear uma amiga durante uma discussão.

Uns dirão que são casos pontuais que podem acontecer sempre, que é inevitável e faz parte do sistema, que existem mecanismos para lidar com isso, que estamos em estados democráticos de direito e são casos de justiça (a justiça que leva a justiça à justiça). Outros respondem simplesmente: “é o negócio, estúpido”.

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Presos em Luta: Agitações nas Prisões Portuguesas entre 1994 e 1996

“A 23 de Março de 1996 ocorreu um “motim” no Forte de Caxias, provocado por interesses de Estado, com o objectivo de acabar com as várias lutas em que os presos estavam empenhados. A revolta transpôs muros e instalou-se no debate público, onde algumas opiniões chegaram a questionar a existência da própria prisão e o seu papel na sociedade. Dos 180 detidos armazenados aos montes e indefesos,-entre o 3º esquerdo e o 3º direito- quase todos sofreram selváticos espancamentos durante vários dias. Dessa prática de terror resultaram múltiplas fracturas e comoções cerebrais, tendo ainda um preso ficado cego de um olho devido a um tiro de bala de borracha dos muitos que foram disparados pelos mercenários do Estado.

O Estado não cumpre a sua própria lei. É sabido que este sempre foi mestre na violação das regras que criou não hesitando em praticar qualquer crime, em interesse próprio, por mais horrendo que seja. No caso dos “presos entre muros”, basta uma simples olhadela pela imprensa de 94 a 96 para verificarmos a escandalosa violação sistemática dos “direitos dos presos”. Greves de fome, greves de trabalho, cartas e comunicados contestando e resistindo a tão cruel realidade, fizeram parte do quotidiano dos detidos a essa época. É neste ambiente que, por ordens superiores Estatais, foi provocada uma reacção espontânea dos presos. Distribuiram-se psicotrópicos fora da “refeição” e o director interino da Direcção Geral dos Servicos Prisionais, em “diálogo” com os presos legítimamente indignados demonstrou o seu total desprezo por eles, seria esta a faísca que iria acender a mecha.

Como é possível que, com total descaramento, treze anos depois, venha o Estado pretender culpar 25 detidos à época, acusando-os em processo judicial de motim, incêndio e danos qualificados?! Alega o Ministerio Público que os presos começaram a organizar-se com lutas de greve de fome e de trabalho duas semanas antes de 23 de Março. Pretendem assim silenciar o contexto de corrupção, de impunidade, e de graves violações à dignidade humana, assim como as lutas de resistência ocorridas nos dois anos anteriores!…

Contra tal “branqueamento” individualidades e diversos colectivos resolveram criar esta publicação, no sentido de relembrar os acontecimentos ocorridos entre 94 e 96 em quase todas as prisões nacionais,  manifestar repúdio perante tão absurdo processo judicial, desmontando a farsa da acusação e denunciar a actuação repressiva dos organismos Estatais, que tiveram um papel activo no aumento do terror vivido nas prisões portuguesas nos anos 90- e que ainda hoje tristemente continua- com o assustador e esclarecedor número de mortes, doentes sem o devido tratamento, presos a cumprirem “condenações” perpétuas encapotadas, mantendo esta escandalosa situação num limbo camuflado e invisível.

Governo, Procuradoria Geral da República e DGSP foram e são os responsáveis pelo que ocorreu e continua a ocorrer com total hipocrisia e silêncio no interior das prisões. O que saíu nos media é apenas a ponta do iceberg.  A haver um julgamento com as regras do Estado de Direito, deveria ser o Estado a sentar-se no banco dos réus e nunca quem sofreu essa  estruturada, premeditada e incomensurável violência.  Se as pessoas pudessem integralmente conhecer a realidade do interior das prisões, ainda que por uma hora apenas, certamente se levantariam em peso para repudiar veementemente este “novo holocausto”, como diz o dissidente criminólogo Nils Christie.

Recentemente, na Europa, várias lutas ocorreram e algumas continuam: em Agosto de 2008 cerca de 550 presos estiveram em greve de fome nas prisões alemãs, reivindicando “melhorias” no sistema prisional; em Novembro a quase totalidade da população prisional da Grécia esteve também em greve de fome -acções de informação e solidariedade em relação a esta greve repercutiram-se por toda a Europa-; em Itália, onde existe prisão perpétua, quase todos os presos afectados por essas condenações levam a cabo desde 1 de Dezembro uma jornada de luta; vários presos de Córdoba e de outras partes de Espanha encetaram uma greve de fome em solidariedade com os prisioneiros de Itália reivindicando ao mesmo tempo uma série de reivindicações ao sistema penal e judicial do Estado espanhol; no verão, Amadeu Casellas, prisioneiro na Catalunha (Espanha)  esteve 78 dias em greve de fome.  Por cá, em Monsanto -um dos Guantanamos do país- vários detidos estiveram, no mês de Outubro, em greve de fome protestando contra as torturas de que são alvo e contra a total impunidade com que actuam os carcereiros desta cadeia.

A luta pela dignidade e pela liberdade jamais poderá ser contida seja em que prisão fôr!

Solidariedade e absolvição para os 25 de Caxias!”

Presos em Luta

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Superioridade moral do ocidente?

A escravatura moderna tem muitas máscaras tal como afirmou Benjamin Skinner no seu perturbador artigo A world enslaved. Algumas delas pavoneiam-se mesmo debaixo do nosso nariz, nos países ricos e civilizados, nas democracias liberais que se reivindicam de elevados valores morais, mas em que o elevado grau de intolerância a estes fenómenos bárbaros é frequentemente uma amarga hipocrisia.

Nos EUA, algumas penitenciárias continuam a antiga prática do trabalho forçado dos reclusos, no algodão, trigo, milho ou soja, com rendimentos de 4 cêntimos por hora e sujeitos a abusos e violência. Muitos deles passarão ali o resto dos seus dias e nem sempre por terem sido condenados a pena perpétua.

Um aspecto marcante é a enorme percentagem de negros nessas condições, fazendo pensar que muito ficou por fazer pelo movimento pelos direitos civis dos anos 60, e que o aparecimento de um candidato negro à presidência não será o resultado de uma transformação tão profunda nas mentalidades como alguns querem fazer crer.

Evidentemente não é só na existência de escravatura ou de práticas racistas institucionais que a pretensa superioridade moral do ocidente deixa muito a desejar. Tendo ainda como pano de fundo as prisões – centros de controlo e dominação por excelência – dei com um artigo no Corrier Internacional deste mês sobre protestos contra o centro de detenção de imigrantes Cornebarrieu, nos arredores de Toulouse, França. condições assombrosas de encarceramento de pessoas inocentes, famílias inteiras, devidamente gradeado, revestido de arame farpado, câmaras omnipresentes, e, claro, placas de metal para impedir a observação do exterior para o pátio onde brincam as crianças.

Afirmar que a superioridade moral do ocidente é uma falsidade não significa que pelo resto do mundo as coisas estejam melhores. É evidente que os direitos humanos são mais respeitados no ocidente do que em África ou no médio oriente, por exemplo. A mim parece-me é muito simplista esta visão do mundo. A prática das democracias ocidentais é muito diferente quando se trata dos seus próprios países ou de países do terceiro mundo ou em desenvolvimento, é muito diferente quando se trata de cidadãos nacionais ou de estrangeiros. Para lá do muro fronteiriço e fortemente vigiado que existe entre o hemisfério norte e o hemisfério sul, as práticas mudam radicalmente e são numerosos os casos de violações graves dos direitos humanos.

A enorme quantidade de produtos fabricados em condições de escravatura do lado de lá do muro, mas com etiquetas ocidentais bem conhecidas com que somos inundados, é um exemplo maior da forma encapotada com que se pretende manter a pose moral e ao mesmo tempo o nível de vida de riqueza e abundância depredadora.

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